c Trambolhão: maio 2009

segunda-feira, maio 25, 2009

O Ritmo

Detesto sentir pena de mim.
Mas como é recorrente este sentimento!
Não gosto de me sentir ofegante,
Mas é preciso correr para chegar lá.
O parque de estacionamento treme,
As moedas pretas não me compraram o lugar.
Já chega de surpresas,
E de mafiosos de sapato branco em casa, Soraia.
Quantas vezes te repito,
“Como te chamas?”
E só me respondeste uma vez,
“Emanuel Tin Tin.”
Gosto de ti assim.

Apetece-me que alguém me diga, és a melhor.
E só me dizem, és a pior.
Ser caixa de supermercado é sofrido,
Os velhos não deixam gorjeta.
Asneiras, Falhas, Decepções,
Errar é humano,
Inumano é não compreender.
Transito de folha,
Mais um episódio da novela,
Jogar às cartas alivia a tensão,
Uma massagem indiana quebra o coração.

Sei fazer contas,
Mas escrever baralha-me a mão.
Prefiro somar e subtrair,
A acrescentar e apagar.
Não passo sem a calculadora,
Já o dicionário pesa no braço.

Tiques de samba,
Batuque de isqueiro,
Jogo do pião na praça,
Cintura de abano e dedo no piano.

Hoje há festa,
O alcóol tresanda a praça,
O Emanuel rima versos sentado,
Assim as pernas não lhe fogem.


Canto de xaile,
Bato na janela,
A Soraia espreita malandra,
O ritmo invade os corpos,
A lua esconde-se envergonhada.
Não há quem me vença,
Esta noite dona serei da minha praça!

sexta-feira, maio 15, 2009

O viajante

Insisto em oferecer-te um par de asas ,
Que tu diariamente escondes dentro do armário,
Para ti os anjos não podem voar.


Sentado na berma da estrada, a ver os carros passar.
As boleias assobiam ao fresco,
O teu rosto emudecido devolve educadamente a oferta,
prefere o trilho de volta a pé.


Até o par de sapatos de dança rotos pouco efeito tem,
Tu dizias, sapatear descalço no alcatrão da estrada é por acaso, uma pura sorte.


O saco carregado de dúvidas às costas, de letras matemáticas com cifrões em chavo,
E picaretas de carvão suadas de lágrimas,
Acumula-se solidamente.
Encurvam-se as costas do soldado vagabundo,
Encolhe-se o olhar, numa franja que esconde o desafio.


Se os se’s crescem à medida das pulsações,
São ervas daninhas da razão,
Trepadeiras das pernas,
Impedem o voo nocturno e celeste do viajante.


Já não se vê o fim do trajecto,
Mas também nunca se viu o princípio.
Em caso de dúvidas a tabuleta indica o sentido,
E o cheiro do mar salgado põe em movimento a marcha.


A garrafa de oxigénio já pesa nas costas,
Há que soltá-la e respirar livremente,
O primeiro sonho quer ser colorido,
A primeira estrada vai ser percorrida,
A primeira vida tem de ser vivida.