c Trambolhão: Sentir

quinta-feira, novembro 29, 2007

Sentir

Desenhaste um círculo na areia com a mão direita.
Sentiste a venda preta a apertar-te os olhos.
Adoçaste a língua com um cubo de açúcar amarelo.
Abraçaste um urso de peluche cheio de pó.
Tocaste na tecla do piano com a ponta dos dedos.
Abriste o saco do café à bruta.
Encolheste a cabeça dentro do gorro de lã.
Embaciaste o espelho do elevador com o teu hálito.
Enterraste as botas na lama fresca.
Rasgaste o jornal velho em tiras desiguais.
Conduziste sobre as pedras rolantes na estrada inacabada.
Encheste as bochechas com água,
Pintaste os lábios sem cuidado.
Pintaste as paredes de vermelho,
Arrancaste uma flor da mãe.
Descobriste um trevo de quatro folhas.
E um anão mágico nas escadas.
No dia do casamento, gritaste SIM, não murmuraste sim.
Deitaste mel sobre os teus cabelos,
Fizeste o pino sobre as escadas,
Atiraste um tiro ao ar,
Brincaste aos cowboys com o Bang Bang,
Envolveste a cintura numa tira de seda,
Escreveste com o lápis a carvão na ardósia preta do quadro,
Fizeste chamadas anónimas ao teu amante e identificadas ao teu marido.
Sempre desenhaste formas imperfeitas na areia molhada.

3 Comments:

At 4:44 da tarde, novembro 30, 2007, Anonymous Anónimo said...

Que lindo pooema!

 
At 9:48 da tarde, novembro 30, 2007, Blogger Joca said...

Formas imperfeitas em contextos imaginários são as formas perfeitas da realidade.
bjs

 
At 1:47 da tarde, dezembro 02, 2007, Blogger GONIO said...

Cada frase é um poema em mais este poema. Digamos que... a menina Inês tem jeito ;)
Bjinho

 

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