Tem dias
Porque a minha raiva crescia consoante o som da minha voz se elevava. Era uma raiva miudinha, que rapidamente podia atingir o tamanho de um gigante verde, parecido aos ogres dos filmes. Porque me apetece gritar e dizer o que penso. Acho que o mundo dos adultos é uma hipocrisia pegada, sorridos amarelos, benovolências e subserviências irritantes de tremer o pé. Está tudo bem, sim, claro, adoro o que faço, sim, mandem-me encher mais um caixote com selos de 16kg com seguro registado de x euros, embrulhar a milhésima encomenda de amostras que eu adoro, ou contar detergentes, essa sim é a parte melhor. De facto aprendi a analisar durante horas a fio enfiada numa cozinha, a composição química de cada um, o Sonasol verde é mais bem cheiroso e perfumado que o Lava lãs rosinha, mas espera, este último tem fosfatos. Drama, especulação, produto retirado do mercado. Os fosfatos caso não saibam são inimigos do meio-ambiente, mas há armadilhas porque também temos os fosfonatos. Calma, penso eu, são amigos, pelo menos o português é parecido.E volta não volta, olho pela janela, que me chama a ver o mar, tão azul, mas ao mesmo tempo distante. Está calmo, acalma-me... Ou a planície verde sem fim, onde ninguém passeia. Ou os cães abandonados que adormecem ao sol perdido. Parecem-me felizes. Olho para o lado, mudaram-me a secretária, por pouco tempo. Tornei-me em 4 meses especialista em adaptação a novas salas de escritório, novas caras e novas tarefas. Ao menos neste aspecto não me posso queixar de tédio, a rotina é agitada e volta não volta o chefe, o big boss lá do centro revira tudo de pernas para o ar. Somos meros peões, dentro dum tabuleiro de xadrez cujos limites desconheço, não há tempo para pensar, só para adaptar. Na casinha do chefe trombudo, temos direito a sentarmo-nos 5 m na poltrona envernizada e com um aspecto meramente decorativo, porque se torna tão inconfortável o confronto com o outro lado, que a dita poltrona depressa nos enxota para a sala comum. E não convém ter pensamentos ruins, não é bom, porque há colegas com peso na consciência que conseguem ler os nossos pensamentos...E a motivação que nos dão é sempre a mesma, é um trabalho chato, monótono, desinteresssante, mas sabe Inês, alguém tem de o fazer. Ou eu avisei-a, eu disse que não era pera doce, mas pelo menos aqui está mais contente não é? Mas há sempre um rebuçado no final da história, aguente-se porque isto pode ser o começo de uma bonita história de amor, daqui a dez anos, pensamos no seu caso.
E eu volto a martelar na mesma tecla, porque será que não podemos dizer tudo o que pensamos? Ou pelo menos, eu conseguir dizer tudo o que penso. Talvez através da escrita consiga, digam-me vocês. Porque para mim os papéis em que eu mexo diariamente não têm alma, não me cantam canções de amor, não me levam às lágrimas, nem a abraçar a vida, são papéis, com palavras tão aborrecidas e desinteressantes que para mim é um alívio poder ir destruí-los à maquina trituradora. Livra, estes já não me perseguem nos meus sonhos hoje, já não há camiões, nem produtos, ou ordens do outro lado a comprometer os meus 5 m de pausa a olhar para o bendito mar. Um dia, envio um conjunto de telegramas anónimos e vou pensar que o que fazemos é realmente uma espécie de prostituição (onde é que eu já ouvi isto), eu vendo o meu trabalho, paguem-me e acabou-se a história. Precisamos deles, como nós deles, numa lógica triste, inumana, interesseira, mas eu não posso dizer muito, sou suspeita, vivo num mundo de fadas e às vezes não quero acordar.
Até amanhã...
12 Comments:
Não tenhas dúvidas que conseguiste aqui escrever o que te vai na alma, na tua e na minha. As nossas conversas à hora de almoço, tudo contadinho que os minutos são poucos, os e-mails trocados às escondidas, os sms quase desesperados... O mundo está a ficar demasiado cão, embora não o cão que está ao sol e que te parece feliz (e está...).
Um beijo grande Inês. Não te prometo um futuro melhor, apenas te prometo a ti mesma, à força que sabemos que tens para aturar certas coisas e muito mais...
Provoquei uma distracção e os homens que estavam na fila olharam todos para a esquerda. Eu aproveitei e avancei pela direita percorrendo, em silêncio, para não ser notado, os quilómetros de fila que nos separavam. :)
Quero chegar perto, muito perto, tão perto de ti quanto possível.
Ups!!!Agr fui eu que me distraí... :D
O texto é muito bom. Estive tão perto que me pareceu sentir o que tu sentes. ;) Acho que compreendo a tua revolta.
Sr. do mundo!
Como corre a vida aí no teu reino?Estás tão perto e ao mesmo tempo longe... Gostava de te ter aqui mais ao pé de mim. Fazes-me sorrir ao ler as tuas palavras, para quem se dizia tão tímido a escrever, és uma revelação:)
Pierre, amigo, que me ouves sempre nas horas de almoço.. obrigada pelo teu incondicional apoio e desculpa se interrompo sempre a tua sesta com os meus telefonemas! eheh_:)
É a crueza destes dias que nos fazem questionar a existência de todos os outros.
Porque é que não é ao contrário?
Os dias bons não poderão suplantar os "tem dias"?
Cara fadista (habitante do mundo das fadas):
Apetece-me dizer: "O meu reino por um beijo!"
No meu reino as coisas vão de mal a pior. Não há nenhuma guerra o que é muito entediante para um Senhor da Guerra como eu. Passar o tempo a ver jogos como os "Matraquilhos Humanos", em que a equipa perdedora é sujeita aos mais vis castigos que possas imaginar, ou à "Macaca Condenada", em que o bobo da corte é obrigado a jogar o tradicional jogo da macaca descalço e num chão cheio de pióneses, já foi chão que deu uvas.
Mas o pior não é isso. O maior castigo foi o imposto pelo Tribunal Universal, que me proíbe de visitar outros mundos nos próximos 1000 anos. Eu pedi muito ao Sr. Juiz que me deixasse ir ao teu mundo, o mundo das fadas, mas em vez disso, ele mandou-me ir às favas. :(
Como se isto não bastasse, sou um mau exemplo para o meu povo. Contagiei-os com o meu vício do póquer. Resultado: a minha sala do tesouro está praticamente vazia, ironicamente despojada dos despojos da guerra. E a única coisa que ainda se consegue encontrar, debaixo dos sofás, atrás dos armários ou nos cantos poeirentos, são fichas de jogo...
Como vês, eu dava tudo para estar mais próximo de ti, mas estou preso neste mundo sombrio, poeirento e perigoso por mais uns séculozitos. A minha única hipótese é recorrer aos serviços do "MAD JOHNNY PALITO", conhecido caminheiro interplanetário, de quem se diz dominar as artes ocultas das viagens no tempo e do teletransporte. O problema é que o preço dele é uma mulher de outro mundo, e eu não consigo sair deste... :(
Mais... o meu mundo está cheio de fosfatos e fosfanatos que como tu bem disseste são inimigos do ambiente, pq consomem muito oxigénio. ;)
Por isso, se eu demonstrar sintomas de hipoxia (falta de oxigénio) posso precisar de respiração boca a boca. Nesse caso, teremos de estar mesmo muito próximos.
É claro que se trata de uma questão puramente humanitária. Nesse caso não ias negar auxílio a um senhor do mundo moribundo... com óculos, pois não? :D
Minha grande amiga inês...Gosto de ver k depois de um interregno prolongado, voltaste aquilo que mais gostas de fazer. A questão está em...quanto é que gostas mesmo de escrever?
No mundo de fadas em que dizes que vives, provavelmente as coisas que queremos vêm-nos bater à porta...ou seja, pensamos naquilo que queremos, ou que pensamos que queremos, e subitamente, alguém nos dá uma oportunidade para sermos senhores de nós mesmos, donos do nosso reino...alguém nos oferece um pedaço do reino deles, num acto de generosidade total...
Pois bem...não é assim que as coisas acontecem...nem nunca acontecerão. A vida é um jogo, e é preciso aprender a jogá-lo...com as nossas características. Quando queremos uma coisa (e temos o talento adequado para isso) temos de persegui-la, e tomar as rédeas do nosso "destino" (se é que isso existe - destino), procurando incessantemente por "um lugar ao sol"...tal como diz o meu amigo Miguel Angelo. Se não há sol onde estamos, devemos fazer as malas e "viajar" à procura do nosso sol (ou sombra, ou chuva, etc...), daquilo que queremos para nós. Passaremos por momentos difíceis, mas chegaremos certamente a um melhor porto do que se ficarmos à espera da nossa fada madrinha...porque essa está muito ocupada com o Peter Pan e outros personagens do género. Se não tomarmos as redeas do nosso destino, então temos de nos sujeitar às regras dos outros, e viver (ou sobreviver) com elas, porke aí sim...seremos peões num jogo que não é o nosso.
Caso contrário, poderemos ver qual é o jogo que gostamos mais, e entrar no mesmo. Ficamos a jogar esse jogo, mesmo que como cavalos ou bispos, e se formos mesmo bons nesse jogo, poderemos começar a ditar as regras do jogos como reis ou rainhas, e eventualmente criar novos jogos, totalmente adaptados às nossas caracterísiticas...visto que haverá sempre alguém no mundo a querer jogá-lo...
Concretizando...quando é que te decides em fazer uma compilação dos teus textos e entrar no jogo?? Começar a perceber como ele funciona...saber quem o dirige? Passar de peão a torre, cavalo, bispo, e depois quem sabe?...ter acesso aos reis e rainhas, podendo influenciar o mesmo?
Como sabes, há mais de um ano que falo contigo sobre isto...tendo já me oferecido para te ajudar a começar o jogo. Tenta, porque senão vais ficar a pensar no que poderia ter sido se tivesses tentado. Sei que às vezes é uma defesa da autoestima, mas não leva a nada...
Não esperes que as coisas venham ter contigo...vai à procura delas!! às vezes estão mesmo ao virar da esquina...temos é de saber por que rua começar.
Beijinho especial do teu grande amigo
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Sr. do Mundo, despertarei os teus sentidos com a minha varinha plim plim plim e soprarei docemente o som eterno da imortalidade. Tudo isto só com os meus poderes especiais, porque sou realmente uma fada plim plim plim e sei todos os antídotos especiais contra os fosfonatos, já estudei a questão a fundo. Hoje o dia no meu reino está cinzento e aborrecido, uma nuvem negra apoderou-se do meu sol e eu deixei os meus duendes a trabalhar por mim na floresta, enquanto eu trato de mim, porque nós fadas temos dias frágeis. E tu onde páras?
O mundo do trabalho pode conduzir-nos à beira de um ataque de nervos. Estive a um passo dele... mesmo quase a desistir, tal eram as agruras dos meus primórdios numa área onde aterrei de pára-quedas! Tive crises de desespero porque os meus supostos "formadores" só me passavam atestados de burrice em vez de colaborar :( Com muita força de vontade, lá consegui dar a volta por cima, rodear-me dos melhores, erguer a cabeça e seguir em frente... Começei a ganhar ânimo e gosto... Hoje adoro o que faço! Mudar!?! Para melhor, de preferência na mesma área ;)
Não desistas da busca do teu lugar ao sol... por vezes, encontramo-lo acidentalmente... Só precisamos de acreditar que conseguimos!!! =)
Cinzento??? Pq? Tratar de ti? Se ao menos eu soubesse...
"Olá nina quero tratar de ti, dar-te o mundo e o outro, tenho tudo aqui, Chega só um pouco perto de mim, acredita que nunca me senti assim."
;)
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