Os meus olhos não envelhecem
Sentado à beira do rio brilhante dos meus olhos,
Avisto ao longe o barco velho a balouçar na outra margem,
E o Barqueiro Negro apressado a resgatar os olhos fechados à força pelo tempo.
Com sua licença, desbravo o alerta pela água,
Não se apresse,
Os meus olhos, estes, estão ainda bem abertos!
Passo a explicar,
Quando desperto a claridade da manhã não me fere a vista,
Antes beija-me a fronte sem pudor,
E envolve o meu olhar no rodopio dos vestidos coloridos da infância.
Confesso que desato os punhos doridos da noite com vagar,
E enquanto as minhas vestes já se agitam pela vida,
Os músculos do meu corpo ainda mastigam os grãos de café.
As minhas mãos, não sei o que fazer com elas,
Nem escondê-las sei, fazem parte de mim,
E as manchas disformes nelas denunciam-me,
Como um tiro certeiro no meio da testa.
As letras, ai as letras, tremem quando escrevo,
E revelam o que os meus olhos escondem enquanto durmo.
Mas quando me olho ao espelho,
Pisco o olho a mim próprio,
Imagino o meu olhar perdido de criança,
Revejo-me jovem, cego de amores,
E vejo-me senhor, senhorio do olhar da vidente,
Que previu a desgraça alheia,
E atingiu apenas quem quis ser atingido.
Os meus olhos não envelhecem, eu sei que não,
A dor do riso continua a jorrar dos meus olhos,
Sal picantes e salgadas, as minhas lágrimas não aprenderam a envelhecer,
E eu também não.